quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Autobiografia

Sou Valesca Brasil Irala. Nasci em 21 de outubro de 1979, em Alegrete. Sou filha de militar do Exército reformado e professora de Biologia aposentada. Não tenho irmãos. Ingressei na pré-escola com três anos de idade, mas confesso que minha primeira professora foi mesmo a minha mãe. Ela me ensinou, desde muito pequena, a contar histórias, declamar versinhos e a ser “respondona” (por osmose), característica que me acompanha até hoje. Diz ela que eu comecei a falar com oito meses. Também segundo contam, com dois anos de idade, fugi de casa para ir a uma pracinha que ficava há várias quadras da minha residência e, quando fui encontrada, disseram que eu estava com um palito de fósforo na boca, simulando que fumava um cigarro. Parece que tomei uma “tunda de laço” bem grande por esse feito. Cresci vendo minha mãe preparando aula e, quando estava na primeira série, gostava de ajudar meus coleguinhas a fazerem as suas atividades, o que não agradava muito a minha professora, pois ela me puxava literalmente pelas orelhas para eu voltar ao meu lugar. Até a terceira série era uma aluna mediana, mas na quarta série minha mãe resolveu me trocar de turno na escola, o que me levou a conhecer uma professora que simplesmente me adorava e me motivava a ser a melhor aluna da turma. Foi a primeira vez que o meu boletim foi para casa recheado de notas máximas, deixando o meu pai cheio de orgulho. Dali em diante, a partir da influência dele e dessa professora, determinei-me que deveria esforçar-me para sempre ser uma aluna assim: brilhante aos olhos dos adultos que estavam ao meu redor! No ano seguinte, essa professora, que já era bem velhinha, faleceu. Lembro-me de ter chorado muito com essa perda, pois é difícil ver partir alguém que significou tanto na vida da gente e nos ajudou a crescer. Segui estudando nessa escola até a sexta série. Nessa época, fiz aula de balé clássico por cinco anos e também fiz aula de inglês durante um ano, numa escola de idiomas da cidade. Lembro até hoje de repetir a pergunta “Do you have any brothers and sisters?”, sem entender bulhufas o que eu estava dizendo. Na sétima série, mudei-me de cidade e sofri muito com a perda das amizades e a diferença do sistema educacional: na nova escola havia notas mensais e não bimestrais e os conteúdos eram rigidamente trabalhados através de apostilas, diferentemente da escola anterior, onde encenávamos bastante peças de teatro e líamos muito na biblioteca, atirados no tapete, em meio a muitas almofadas coloridas. No mês de março de 1993, tirei a minha primeira nota abaixo da média: 4 em Matemática! Foi ali que a minha ideia de cursar Arquitetura ou Engenharia estava acabada. Mais ou menos desde os 10 anos, colecionava as plantas baixas dos apartamentos que saiam no jornal todos os domingos e, também, brincava de construir plantas baixas de escolas, de bairros, de cidades, etc. Entretanto, aquela nota baixa em Matemática me havia dado uma sentença: as exatas não eram comigo! A partir dali, fiz aula particular de Matemática até o final do Ensino Médio, mais por costume e preguiça do que por real necessidade. Quando fui para o Ensino Médio, minha mãe decidiu que eu deveria fazer um curso técnico. Então, ingressei no curso “Técnico em Processamento de Dados”, junto com outros ex-colegas do Ensino Fundamental. O curso era puxado. Havia aula de manhã e de tarde. Eram mais ou menos umas treze disciplinas, se não me engano. Eu acordava cedo para estudar nos dias de prova. Conseguia notas razoáveis (menos em Educação Física, que nunca foi o meu forte) e ia levando a vida de estudante e de adolescente como qualquer pessoa da minha idade, até que minha mãe descobriu que eu andava de namoro no colégio e resolveu me trocar novamente de escola. Na nova escola, havia curso de magistério na época e então me defrontei pela primeira vez com a ideia de ser professora. Entretanto, minha mãe me disse que se era para eu cursar magistério, ela me colocaria numa escola pública. Até então, a ideia de estudar em escola pública me parecia um absurdo, pois a vida inteira estudei em escolas particulares. Eu tinha muito preconceito contra a escola pública, mas esse pensamento que foi revisto somente quando me tornei docente em uma. Foi assim que decidi não cursar magistério. Nessa mesma época, comecei a estudar espanhol por meu interesse, algo que meus pais não levavam muita fé, pois estavam acostumados a me ver iniciando alguma atividade extra-classe e abandonando-a tempos depois. Com o espanhol foi diferente, tanto que quando eu estava no terceiro ano do Ensino Médio, tive minha primeira experiência docente: preparava para o vestibular um candidato à Engenharia de Alimentos da FURG, de Rio Grande, dando aulas de Espanhol. Das quinze questões da prova, ele acertou catorze. Fiquei super-orgulhosa! O período da escolha profissional foi difícil. Fiz orientação vocacional, busquei currículos de cursos em diferentes universidades, lia semanalmente o jornal para observar as exigências do mercado de trabalho, comprava o guia das profissões, etc. Prestei vestibular para Jornalismo assim que terminei o terceiro ano, na UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul). Fiz uma excelente pontuação para quem estava recém terminando o Ensino Médio, mas eram na época dezoito candidatos por vaga nesse curso (eu tinha nota para aprovar em Relações Públicas, em Letras, em História, mas não em Jornalismo). Fiquei na suplência e nunca fui chamada. Decidi não ficar parada e iniciei o curso de Jornalismo na URCAMP, em 1997. Meus pais faziam um grande esforço para pagar mais de quinhentos reais pela minha mensalidade. Em seguida, comecei a trabalhar em um jornal impresso e fazia estágio não-remunerado numa emissora de TV, mas o que eu ganhava dava apenas para comprar algumas roupas e gastar nas festas (danceterias) que, a partir dessa época, passei a frequentar semanalmente. No terceiro semestre do curso, entrei em crise existencial e desisti do Jornalismo. Voltei a pensar em um outro curso que pudesse me realizar e, então, surgiu a primeira turma de Letras (Português/Espanhol) da URCAMP. Ao longo da faculdade, fiz estágio na Prefeitura Municipal e trabalhei em três escolas da rede privada. Durante o curso, conheci uma professora chilena que me incentivou muito e me ajudou a ter o meu primeiro trabalho apresentado em um congresso científico. Aquela oportunidade mudou a minha vida!!! Desde aquele dia em que participei desse primeiro congresso, no ano 2000, quando apresentei um trabalho num simpósio organizado pelo prof. Hilário Bohn, nunca mais tirei da minha cabeça uma ideia: minha grande meta era fazer um curso de Mestrado. Quando terminei a graduação, em 2002, fui cursar disciplinas como aluna especial na UCPel, em Pelotas. Lá convivi com pessoas maravilhosas: prof. Hilário, prof. Leffa e profa. Aracy. No mesmo ano em que entrei no mestrado, comecei uma especialização em Língua Espanhola na mesma universidade. Nessa época, conheci a profa. Beatriz Gabbiani. Os anos de 2003 e 2004 foram muito intensos: especialização, mestrado, namoros, professora na rede municipal e estadual e também professora universitária na URCAMP. Idas e vindas semanais a Pelotas. Além disso, não abandonava minhas festas de final de semana e nem a musculação (que pratiquei por dez anos consecutivos), porque ninguém é de ferro e eu gostava de ter vida social!!! Quando o mestrado terminou, senti um vazio tão grande que percebi que não poderia parar por ali. Em 2005, já não era mais professora estadual, mas continuava dando aula em cinco escolas na rede municipal e também no curso de Letras da URCAMP. Meu dia de folga era quarta-feira e eu ia toda semana no ônibus da meia-noite para Porto Alegre para cursar disciplinas como aluna especial nos Programas de Pós-Graduação em Letras e em Educação da UFRGS. Em outubro daquele ano, conheci a Profa. Amanda Scherer, no evento de Análise do Discurso que a UFRGS realiza de dois em dois anos. Naquele evento, após assistir a palestra de um psicanalista, desisti de tentar fazer a seleção do Doutorado da UFRGS em Linguística Aplicada, na qual eu estava inscrita há alguns meses e aconteceria no mês de dezembro. Lá iria um ano perdido. Entretanto, para minha surpresa, em janeiro de 2006, soube que não havia tido nenhum aprovado no Doutorado em Letras da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e que a instituição reabriria a seleção. Tentei e consegui o primeiro lugar, vindo a ser orientanda da Profa. Amanda Scherer. Nem acreditei!!! Nessa mesma época, abriram os primeiros concursos da então recém criada Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA) e eu fiz o primeiro concurso para professor de Língua Espanhola e Linguística Aplicada dessa nova instituição pública. Em um primeiro momento, pensei em não tentar, por achar que seria bom demais para ser verdade conseguir uma vaga para docente justamente na minha área e na minha cidade, pois a grande maioria das pessoas que ali estavam se candidatando vinham de muito longe para conseguir um emprego, mas a Profa. Amanda me convenceu de que se eu não tentasse, iria me arrepender para o resto da vida. Resultado: passei em primeiro lugar! Precisei abandonar meus alunos da rede municipal e da universidade privada em que atuava, mas era um novo desafio que se avizinhava e eu não podia deixá-lo passar. Nessa mesma época, fui informada que abriria o curso de Doutorado da UCPel. Eu já estava fazendo o doutorado na UFSM, mas a possibilidade de retornar à UCPel, um lugar onde um me sentia tão em casa, foi determinante para minha decisão: prestei seleção novamente e, de novo, assim como no mestrado, não precisei pagar nenhuma mensalidade, visto que fui contemplada com a bolsa modalidade II da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior). Estava de volta ao lugar que mais abriu meus horizontes e perto das pessoas que mais eu aprendi na vida! Conciliei o trabalho na UNIPAMPA e o Doutorado até o ano de 2009, quando conclui a tese e a defendi para os cinco membros da banca, entre eles a minha amiga Clara Dornelles. Nesse mesmo ano, casei-me com o Arlei Tonel. O pique para as festas nessa época também já não era mais o mesmo de antes. Lá se ia mais uma etapa. Minha vontade de continuar aprendendo coisas novas sempre foi muito grande e, em 2010, conversei em um evento com a Profa. Beatriz Gabbiani sobre a possibilidade de fazer pós-doutorado na Universidad de la República, em Montevidéu, sob sua supervisão. Comecei os trâmites burocráticos e mesmo sem afastamento total da UNIPAMPA para ir a Montevidéu, comecei em 2011 as atividades de pós-doutorado, viajando uma vez por mês e “me virando” como podia para seguir aprendendo, porque descobri que o que me move nessa vida são as descobertas que posso fazer, o convívio com pessoas com as quais posso aprender, as inquietações e dúvidas que ficam martelando, martelando e que não se respondem nunca completamente... O dia em que não puder ter mais isso, não preciso mais existir!!!

Bagé, 25 de agosto de 2011.

Valesca Brasil Irala